RELACIONAMENTOS ABERTOS - PARA COMEÇAR A PENSAR
Estou lendo o romance francês Bonjour
tristresse de Françoise Sagan, traduzido para o português como Bom
dia, tristeza em várias edições, entre elas, a coleção da Folha,
Mulheres na Literatura. É considerado um dos melhores textos da língua francesa
no século XX. Trata-se de um romance, escrito na década de 50, sobre a vida
afetiva e sexual de uma adolescente. Para a época, o livro foi considerado escandaloso
por tratar da vida sexual de uma moça. Logo escrevo mais sobre ele.
Paralelamente, também estou lendo o livro
brasileiro O anel que tu me deste – O Casamento
no Divã da psicanalista e terapeuta de casais há mais de 30 anos, Lidia
Rosenberg Aratangy. Comecei este blog por sugestão de amigos, mas acho que só o
mantive pelo sucesso inesperado dos meus comentários sobre os livros da
psicanalista alemã e norte americana Karen Horney (1885-1952) sobre a
necessidade neurótica de ser amado (a) (Relembre clicando aqui).
No final, talvez tudo passe por
relacionamentos, até a política e economia. Em alguns vídeos, o médico e
escritor brasileiro Flávio Gikovate (1943-2016) também diz isso. Hoje estou com
uma pulguinha atrás da orelha me dizendo que o tema precisa ser “relacionamento
aberto”.
Meu pai, nascido em 1950, era fã dos
escritores e filósofos Jean Paul Sartre e Simone de Beauvoir e,
consequentemente, do relacionamento aberto que eles tiveram durante várias
décadas. Eu nunca pesquisei em detalhes, mas já critiquei a Simone de Beauvoir
pela submissão que ela demonstrou ao Sartre no livro A Convidada (relembre
clicando aqui).
Admiro várias ideias da Simone de Beauvoir, mas a vida dela não é um modelo
para mim.
Mas a escritora Lidia R. Aratangy me parece
dura demais com Sartre e Beauvoir. Vou transcrever o texto da autora na íntegra
e tecer alguns comentários entre parênteses:
Todos esses mitos estiveram presentes
no relacionamento de Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir, casal que se tornou
ídolo e modelo para mais de uma geração, tanto por seus livros quanto por suas
posições políticas e pessoais.
(a autora se refere ao que ela chama de
mitos modernos sobre o casamento:
(1) o mito da transparência, isto é, o
compromisso mútuo e comunicar ao parceiro ou parceira todos os sentimentos e
desejos, incluindo partilhar confidências de eventuais envolvimentos paralelos;
(2) o mito da liberdade, isto é, uma falsa
noção de independência, na qual cada um ignora os sentimentos do outro,
recusando-se a prestar contas de seus atos;
(3) o mito do anel de vidro, isto é, a
fantasia de que a relação amorosa seria como um anel de vidro, não pode ter
trincas.
(4) o mito da paixão fugaz: depois da
consolidação do vínculo, a paixão cederia lugar ao amor, sentimento mais
tranquilo.)
Beauvoir e Sartre no começo do relacionamento. |
Poucos casais teriam hoje a ousadia
de Sartre e Simone (por que a autora Lidia R. Aratangy
trata Sartre pelo sobrenome e Simone Beauvoir pelo primeiro nome? Considero
isso um tipo de machismo inconsciente que sempre corrijo em textos acadêmicos) que,
ainda na primeira metade do século passado, atraveram-se a fazer um contrato de
casamento aberto e um pacto de transparência incondicional. No livro
Tête-a-Tête, a biógrafa Hazel Rowley, baseando-se em entrevistas e documentos
fidedignos, traça um retrato sem retoques do relacionamento que o casal manteve
com os muitos parceiros que se tornaram personagens de sua história. É fato que
o vínculo resistiu a intempéries implacáveis e sobreviveu desde os primeiros
encontros, em 1929, até a morte de Sartre, mais de 50 anos depois.
Mas a um preço alto. Ela padeceu a
vida inteira de terríveis crises de ansiedade e desespero, que levavam a
acessos de choro repentino, assolada pelo que ela própria referia como “o pior
dos pesadelos”: a ideia da morte dele (Na minha
opinião, nada disso necessariamente foi causado pelo relacionamento aberto.
Isso pode ter sido a cause da escolha por um relacionamento aberto e não a consequência).
Não
é preciso ser conhecedor profundo do funcionamento mental para entender que a
angústia sufocante derivava do conflito entre o medo de perder o companheiro e
o desejo de se liberar de um pacto que se fazia intolerável (Duvido.
Provavelmente ela já sofria disso antes de conhecer Sartre). Sartre,
por seu lado, continuou até a morte a ter casos eventuais, sempre com moças bem
mais jovens e em posições de aprendizes, as quais ele ajudou financeiramente
enquanto viveu (Hoje chamaríamos de sugar
daddy). Mas também era sujeito a crises depressivas, que ele combatia tomando
doses muito altas de anfetamina (chegava a tomar 20 comprimidos num dia)
(Na minha opinião, isso prova que ambos eram desequilibrados, mas não
necessariamente por causa do casamento aberto).
Beauvoir e Sartre na fase madura do relacionamento. |
No entanto, o que mais chocou os
fiéis admiradores do casal foi a descoberta do tratamento desrespeitoso que
ambos tiveram com aquelas pessoas com quem se envolviam
(Por isso que, cultivar o amor e o respeito mútuo deve vir primeiro em qualquer
forma de casamento). Toda hipocrisia que veio à tona – os comentários
maldosos, as constantes mentiras e engodos, o total descaso com relação aos
sentimentos alheios – embaçou irremediavelmente a aura de admiração e inveja
que há tanto tempo cercava o casal (Ok. Mas não existe hipocrisia e
mentira também em casamentos fechados?). A imagem do casal inovador, pioneiro em
viver uma relação amorosa intensa e duradoura, sem abrir mão do respeito a
liberdades individuais, foi substituída por um quadro melancólico de dois seres
vaidosos, incapazes de respeitar se quer os próprios sentimentos.
De qualquer modo, relacionamento aberto
deve ser um tema de perguntas frequentes. Eu já vi um vídeo sobre a pergunta:
As relações, no futuro, serão mesmo do tipo "poliamor"?. O Dr.
Gikovate entende poliamor como sinônimo de poliamor e se mostra cético quanto a
praticabilidade. Vale a pena conferir.
A monja Coen também responde à pergunta: Como o
budismo vê a fidelidade e o relacionamento aberto?. Ela também é cética com
relação ao casamento aberto. Ela acha que o compromisso com a fidelidade traz
mais felicidade.
Até o canal da drag queen Rita von Hunty
(Tempero Drag) tem um vídeo sobre o relacionamento aberto. Ela traz estudos da
base biológica e sociológica. Segundo ela, existem motivos contra e a favor.
Mas, até ela, tende mais para os relacionamentos fechados.
Em resumo, relacionamentos não são fáceis. Eu acredito que
relacionamento aberto não seja para 99,9999% das pessoas.
Muito obrigada a você que acompanha o nosso trabalho. Por favor, fique à
vontade para deixar seus comentários. Também é possível acompanhar as novidades
pela nossa página no Facebook.
BOA SEMANA!
BOAS LEITURAS!
Texto interessantíssimo! Esse é um assunto que ainda precisa ser debatido exaustivamente!!! Também achei que a escritora que analisou o casal Sartre e Beauvoir (sobrenome para os dois hehehe) com muitos preconceitos, e não com uma visão científica, neutra e puramente analítica! Também concordo com a sua posição, acho que quase ninguém está preparado para isso, o que eu vejo por aí de relatos, é que muitas pessoas (principalmente homens) usam dessa exigência no relacionamento mais como uma manifestação de poder no relacionamento, e a outra pessoa acaba aceitando (às vezes nem nos mesmos termos) para manter o relacionamento... É muito complexo! E interessantíssimo!
ResponderExcluirPura verdade, Rô!
Excluir