QUAL A PROBABILIDADE DE UMA TRAIÇÃO? PORQUE NOSSAS PREVISÕES FALHAM.
Domingo,
15 de julho de 2018. Hoje teve final da Copa do Mundo de
Futebol Masculino. A Croácia, pela primeira vez na final desse campeonato, foi
derrotada pela França (por 4 a 2), que se tornou, assim, bicampeã mundial.
Essa final está de acordo com a análise
estratégica de Pankaj Ghemawat,
referência mundial em estratégia, que afirmou que times de países menores e
desconhecidos, agora têm mais chances de se destacar numa Copa do Mundo, como
foi o caso da Croácia. Relembre o que já falamos sobre estratégia, clicando aqui.
Por outro lado, antes desse evento,
choveram previsões sobre quem venceria. Entre as maiores “gafes”, estava a
previsão dos estatísticos do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação
(ICMC) da Universidade de São Paulo (USP), campus São Carlos. Leia a
reportagem, clicando aqui.
Como sabemos, a Alemanha, apesar de campeã da última Copa, foi desclassificada
na fase inicial do evento deste ano.
Isso tem tudo a ver com a leitura que
terminei: o livro O Sinal e o Ruído –
Por que tantas previsões falham e outras não do estatístico
norte-americano Nate Silver. Demorei quase 45 dias para lê-lo, num período
turbulento da minha vida, mas valeu a pena ter insistido.
O livro traz vários insights sobre a vida em geral. Ele começa descrevendo como
funcionam os métodos de previsão e quais são os desafios para fazer desafios em
cada área, começando pelo esporte, passando pela política, abrangendo a
propagação de epidemias, pôquer, xadrez, as previsões meteorológicas, eventos
catastróficos como furacões, terremotos e atentados terroristas, entre muitos
outros campos.
Em seguida, o autor passa noções gerais do
método estatístico de que é partidário, a estatística bayeseana, que eu
particularmente também vejo com bons olhos. Talvez, o exemplo mais didático,
por ter um apelo emocional, para se explicar como funciona o raciocínio
bayeseano seja o seguinte (retirado do livro):
O teorema se concentra na probabilidade
condicionada. Ou seja, fala da probabilidade de uma teoria ou hipótese ser
verdadeira se tiver havido determinado acontecimento.
Imagem retirada do site PixaBay. |
Suponha que você é uma mulher e mora com
seu namorado. Ao voltar de uma viagem de negócios, você descobre uma peça de
roupa íntima desconhecida na gaveta do seu armário. Talvez se pergunte: qual a
probabilidade de uma traição? A condição é a roupa íntima encontrada; a hipótese
que você deseja considerar é uma traição. O teorema de Bayes, acredite ou não,
pode oferecer uma resposta a essa pergunta – contanto que você saiba (ou esteja
disposta a calcular) três variáveis:
·
Primeiro, é preciso estimar a
probabilidade da aparição de uma roupa íntima numa condição em que a hipótese
seja verdadeira – ou seja, em que houve mesmo traição. Consideremos, para
efeito de discussão, que a roupa íntima em questão seja uma calcinha. Se ele a
está traindo, não será difícil imaginar como a calcinha foi parar na gaveta.
Então, mais uma vez, mesmo (e talvez especialmente) que ele a esteja traindo,
você esperaria que fosse pelo menos mais cuidadoso. Digamos que a probabilidade
de a calcinha aparecer, como condição para ela a estar enganando, seja de 50%.
·
Segundo, você precisa estimar a
probabilidade da aparição da calcinha numa condição em que a hipótese seja
falsa. Se ele não a está traindo, existe alguma explicação inocente para
justificar o fato de a calcinha ir parar ali? É claro que nem todas as
possibilidades serão agradáveis (a calcinha pode ser dele). As roupas dele
podem ter se misturado às de outra pessoa durante o voo. Ou, quem sabe, talvez
uma amiga em quem você confia tenha passado uma noite ali. A calcinha poderia
ser um presente para você, que ele esqueceu de embrulhar. Nenhuma dessas
teorias é, em si, insustentável, ainda que algumas beirem o inverossímil.
Tomadas em conjunto, você atribui a elas uma probabilidade de 5%.
·
Terceiro e mais importante, você necessita
daquilo que os bayesianos chamam de probabilidade prévia. Em quanto você
estima a probabilidade de uma traição antes de encontrar a calcinha? É
claro que não é fácil ser objetiva a esse respeito agora que a calcinha se
materializou. Em termos ideias, estabelecemos essa estimativa prévia antes de
examinarmos o indício. Porém, às vezes, é possível estimar, de modo empírico,
um número como esse. Por exemplo, estudos demonstram que, num ano qualquer,
cerca de 4% das pessoas casadas traem seus cônjuges, de modo que tomaremos essa
estimativa como nossa probabilidade prévia.
Uma vez estimados esses números, o teorema
de Bayes pode, então, ser aplicado para estabelecermos uma probabilidade
posterior. Esse é o número em que estamos interessados: qual a
probabilidade de uma traição, levando em conta que encontramos aquela peça
íntima? Veja o cálculo na tabela abaixo:
PROBABILIDADE
PRÉVIA
|
||
Estimativa inicial das chances de
traição
|
x
|
4%
|
UM
FATO NOVO: A CALCINHA MISTERIOSA É ACHADA
|
||
Probabilidade do surgimento da calcinha
como condição de traição
|
y
|
50%
|
z
|
5%
|
|
Estimativa revisada da probabilidade de
traição, considerando que você achou a calcinha
|
xy/ (xy+z(1-x))
|
29%
|
Na verdade, essa probabilidade ainda é, de
certa forma, baixa: 29%. O número pode parecer contra nossa intuição – aquela
calcinha não é bastante incriminadora? Mas isso decorre especialmente por
estimarmos como pequena a probabilidade prévia de traição. Apesar de um homem
inocente dispor de um número menor de explicações plausíveis para a aparição da
calcinha em relação a um homem culpado, seu raciocínio partiu do princípio de
que ele é inocente, o que pesa muito na equação.
Segundo o livro, soldados que foram
treinados para desenvolver o raciocínio bayesiano durante a guerra, tomaram
decisões mais eficientes sob pressão. Também existem evidência que bons médicos
elaboram diagnósticos mais precisos, porque aprenderam a desenvolver um
raciocínio bayseano (na maioria dos casos, intuitivamente).
O exemplo é didático, porque é muito
emocional (para algumas pessoas), essa coisa de adultério. Mas, preciso
lembrar que é, em si, um exemplo muito machista. Nada indica que os homens
traem mais. Como seria esse exemplo se
fosse um homem que morasse com sua namorada e tivesse encontrado uma cueca que
não fosse sua?
Presidente Ronald Reagan entregando a Medalha Presidencial da Liberdade para a historiadora militar Roberta Wohlstetter. |
Para tentar contrabalancear com algo mais
feminista, devo mencionar que a leitura desse livro também me levou a conhecer
uma mulher extraordinária: a historiadora militar norte-americana Roberta
Wohlstetter ( 1912 – 2007). Ela escreveu um ensaio sobre porque o ataque a
Pearl Habour era óbvio e foi cegamente ignorado pelos EUA. Seu livro era a
leitura favorita do Secretário de Defesa, Donald Rumsfeld. Seu conhecimento,
levou a ganhar a Medalha Presidencial da Libertada das mãos do Presidente
Ronald Reagan.
Se você gostou deste livro, talvez se
interesse pelos comentários sobre os livros: O Andar do Bêbado de Leonard Mlodinow e A Lógica do Cisne Negro
de Nassim Nicholas Taleb. Nós já lemos ambos. Relembre clicando aqui.
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